quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Mirante (História Verídica)

     Sinto ainda o cheiro de terra das ruas esburacadas, de onde vivi.
    Os antigos e imensos casarões que escondiam dentro de si segredos jamais revelados.
     Era uma criança cautelosa e via mistério em tudo. Desconfiada, observava tudo e todos do ponto mais alto que havia encontrado. Por dentro dos muros do velho casarão onde morávamos e da singela goiabeira que com carinho me abrigava em seus mais finos galhos onde após a chegada do colégio passava a maior parte do tempo até o sol se pôr.
    Alto refúgio, mirante, lugar seguro onde podia me esconder de intrusos em meu pequeno mundo, Dali eu podia observar ao longe as pessoas que na rua passavam e podia também ver os tenebrosos casarões.Entre eles um gigantesco  sobrado que não havia mais um dedo de tinta, com suas doze janelas que davam  para  o sul  e outras duas para oeste e  apenas uma enorme porta que se abria entre estas .Este me assustava com sua imponência,parecia  estar abandonado e com minha imaginação achava que queria me dizer algo. Muitas vezes pensei vê-lo abrindo suas janelas  e a grande porta tentando me despertar para sua terrível história.O que teria acontecido de tão importante naqueles frios aposentos?. Minha imaginação era que,  a grande porta seria uma enorme boca e as duas janelas da frente,, os olhos,,mas,, e porque haviam tantas janelas laterais?
    A escada que dava acesso a esta grande parecia ter sido uma grande língua que outrora havia tragado a muitos  que por ali passaram.Podia vê-lo perfeitamente dos   dois lados, frente e lateral.Acredito que em todos os meus longos oito anos,jamais vira  um só pincel trabalhando aquelas paredes, provavelmente durante décadas isso n ao acontecera.  A parte inferior do sobrado era divida em doze portas onde foram transformadas em pequenas casas com minúsculos cômodos que em minha concepção
    Poderia ter sido abrigo de escravos, pois havia lá suspeitos pilares. Ainda mais assustador,  era o morador da parte superior. Um senhor idoso com grandes bigodes q eu pareciam movimentar-se para cima e para baixo. Usava calças acima do umbigo abotoadas com suspensórios, na cabeça um chapéu de couro, botas e seu caminhar era tilintoso pelas esporas. Numa cadeira de balanço situada na grande área superior, com um fedorento cachimbo que fumegava parecendo um vulcão em erupção passava boas horas do dia. Ao entardecer desaparecia para dentro do misterioso casarão.Homem de poucas palavras e de rude semblante que jamais se via de prosa com alguém, nem mesmo com sua companheira, a esposa que o servia  sempre calada.Senhora de olhar tristonho, vestidos escuros, longos e franzidos, avental pendurado no pescoço e um pano envolto a sua cabeça tampando-lhe a testa, não se via um sorriso se quer naquele rosto.
    Eu estava prestes a completar nove anos e a cinco fazia tal negócio, observara com atenção e dedicação tais fatos.  Seria ela a esposa, ou uma única escrava que ainda lhe restara? Podia ser uma escrava branca!! Que mistério era aquele que envolvia o solitário casal e o tão sinistro casarão?

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